A FESTA DO AMOR

A FESTA DO AMOR

Haroldo Figueira. 

Chegou dezembro. A paisagem urbana já mudou de aparência.  Luzes e cores ornam edifícios, residências, estabelecimentos comerciais, ruas e praças. Shoppings centers capricham na decoração erguendo imensas estruturas imitando árvores com enfeites de alto a baixo, na base das quais, sentados em seus tronos, papéis noéis bonachões fazem a alegria da criançada. Corais afinados apresentam-se para diversificadas plateias entoando cânticos que enternecem o público espectador. São alguns dos sinais característicos dos preparativos para a festa maior da Cristandade.

O comportamento humano, individual e coletivo, passa, também, por notórias transformações. De repente, a indiferença para com o outro dá lugar ao exercício da solidariedade; as famílias pacificam-se, rezam e confraternizam unidas; amigos e colegas trocam cumprimentos e mensagens de felicitações; as pessoas mais humildes são lembradas, assistidas, presenteadas; a meninada alvoroça-se ante a expectativa de ganhar os brinquedos que almeja; uma espécie de enlevo espiritual parece apoderar-se da sociedade, deixando-nos a todos  mais humanizados e propensos a fazer o bem.

Tudo porque é Natal, a milenar celebração cristã que, apesar de se repetir há tanto tempo, continua a contagiar e comover povos de todos os continentes com sua mensagem de paz e de amor. Com efeito, foi por amor que Deus enviou à Terra seu filho unigênito, encarnando-o no ventre de uma virgem, com a missão de libertar a humanidade da condenação eterna e abrir-lhe, novamente, as portas do Paraíso.

Foi por amor, sem dúvida, que, ao responder “eis aqui a serva do Senhor, faça-se em mim segundo a tua palavra”, Maria deu seu sim ao anúncio do Anjo Gabriel, concordando em fazer parte do projeto de redenção do Criador. Dá para imaginar o medo que tomou conta da jovem e inexperiente nazarena ao se dar conta da grandeza do compromisso que assumiu. E não era para menos. Atribuir sua gravidez inesperada à intervenção do Espírito Santo dificilmente convenceria alguém. Além do mais, ela havia sido prometida em casamento a José. Pelas leis hebraicas de então, a pena para uma mulher acusada de adultério era a morte por apedrejamento. Ainda assim, apesar da responsabilidade e dos riscos, foi em frente.

Por outro lado, até que ficasse convencido de que a gestação de sua esposa era obra divina, muita angústia e sofrimento deve ter invadido o coração de José. Reza a tradição que, inicialmente, passou-lhe pela cabeça abandonar a mulher. Não o fez temeroso do que fatalmente iria acontecer com ela. Foi por amor, pois, que a acolheu, assumiu a paternidade do menino, criou-o, educou-o e protegeu-o, ensinando-lhe, inclusive, a sua profissão.

Infelizmente, se Deus é pródigo em amor, o ser humano nem sempre o é.  As circunstâncias do nascimento do Filho de Deus evidenciam isso. Depois de peregrinar de porta em porta pelas hospedarias de Belém, José não encontrou quem desse guarida à Maria que se encontrava prestes a dar à luz. Só restou ao casal a alternativa de alojar-se em uma gruta que servia de abrigo aos animais. Foi lá que Jesus nasceu, tendo por berço  uma manjedoura forrada de palhas.

Durante sua curta vida pública Jesus pregou e praticou o amor. Os Evangelhos estão repletos de ações que demonstram esse propósito. Foi por amor que perdoou e salvou de morte cruel a mulher adúltera. Por amor curou doentes, restituiu a visão aos cegos, restabeleceu a capacidade de andar aos paralíticos, alimentou a multidão faminta que o ouvia doutrinar, ressuscitou defuntos. Por trás dos muitos outros milagres que fez nota-se, à exaustão, os vestígios do amor.

Será que existem lições de amor mais profundas e misericordiosas do que aquelas contidas em parábolas como a do Filho Pródigo, onde o pai não apenas perdoa o filho que o havia abandonado, mas rejubila-se e festeja a sua volta ao lar? Ou a do Bom Samaritano que teve piedade do judeu assaltado, cuidou dele, curou-lhe as feridas, abrigou-o e pagou pelas despesas de sua recuperação, enquanto, gente dedicada à religião, no caso um sacerdote e um levita, passaram antes pelo moribundo e nada fizeram?

Quem se detiver na leitura do capítulo 5, do Evangelho de São Mateus, há de aprender muito sobre a dimensão do amor de Cristo: “Tendes ouvido o que foi dito: olho por olho, dente por dente. Eu, porém, vos digo: não resistais ao mau. Se alguém te ferir a face direita, oferece-lhe também a outra. Se alguém te citar em justiça para tirar-te a túnica, cede-lhe também a capa. Se alguém vem obrigar-te a andar mil passos com ele, anda dois mil. Dá a quem te pede e não te desvies daquele que te pedir emprestado” (Mt, 5, 38-42).

Ou no que vem na sequência: “Tendes ouvido o que foi dito: amarás o teu próximo e poderás odiar o teu inimigo. Eu, porém vos digo: amai os vossos inimigos, fazei bem aos que vos odeiam, orai pelos que vos (maltratam e) perseguem. Deste modo sereis os filhos de vosso Pai do céu, pois ele faz nascer o sol tanto sobre os maus, como sobre os bons, e faz chover sobre os justos e sobre os injustos” (Mt 5, 43-45).

Os trechos das Escrituras que citei dão apenas uma ideia do muito que Jesus ensinou sobre o amor. Seu compromisso com esse sentimento era de tal ordem que, por amor, entregou sua própria vida pela salvação da humanidade, corroborando, na prática, o que dissera em uma outra passagem bíblica: “Ninguém tem maior amor do que aquele que dá a vida por seus amigos” (Jo 15, 13).

O texto que acabo de escrever exprime uma reflexão pessoal sobre os festejos do Natal. Muita coisa nobre e bonita é realizada nessa ocasião. Lamentavelmente, findo dezembro, o entusiasmo altruísta desaparece e as pessoas voltam a fechar-se em si mesmas. O bom seria que as demonstrações de boa vontade que testemunhamos sazonalmente durassem o ano inteiro. Se tal ocorresse, com certeza viveríamos em um planeta mais justo, pacífico e fraterno.

Um feliz e abençoado Natal aos meus diletos leitores, extensivo às suas digníssimas famílias.

Brasília, 10 de dezembro de 2018.

 

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