TERRA PAUXI

TERRA PAUXI

Por Haroldo Figueira. 

Óbidos é conhecida como a Cidade Presépio do Baixo Amazonas. Mesmo tendo nascido e vivido lá até os primeiros anos da vida adulta, nunca tive a curiosidade de saber o porquê desse belo epíteto. Imagino que se deva, talvez, à pacificidade que o lugar inspira e ao aspecto bucólico que transmite, guardando, presumo, similitude com a gruta de Belém em que a Sagrada Família se refugiou e onde aconteceu de Maria dar à luz ao Filho de Deus e Salvador do mundo.

Trata-se de um núcleo urbano antigo. Sua origem remonta ao ano de 1697, quando, por razões de ordem militar, os colonizadores portugueses resolveram construir o Forte Pauxis (batizado com esse nome em alusão à tribo indigena que habitava o lugar), em vista da posição estratégica da localidade, situada à margem esquerda do Rio Amazonas, ponto em que o caudaloso curso d'água se estreita e ganha profundidade, reduzindo sua largura para cerca de 1800 metros.

O passado militarista do lugar deixou de legado histórico, além de monumentos, como o forte a que fiz referência no parágrafo anterior, o quartel Genera Gurjão (uma bela edificação em forma de castelo erguida pelo Exército Brasileiro) e a Fortaleza Gurjão, dotada a canhões Vickers-Armstrong, do início do século pretérito, Ocultos por densa vegetação, assentados no cume da Serra da  Escama, à leste da sede do município. Por conta dessa estrutura de defesa, a cidade fez jus a mais um qualificativo: Sentinela da Amazônia.

Encravada no oeste do Pará, a urbe obidense localiza-se a mil e cem quilömetros em linha reta da capital Belém. Ganhou a denominação que preserva até os dias de hoje nos idos de 1758, ano em que ascendeu ao patamar de vila, por ato do então plenipotenciário da Amazônia Francisco Xavier de Mendonça Furtado (irmão do lendário governante português Marquês de Pombal). A elevação à categoria de cidade aconteceu em 1854.

O nome, Obidos, herdou-o de sua coirmā existente em Portugal. Segundo a opinião de alguns entendidos, deve-se ao traçado de suas ruas, à arquitetura colonial de seu casari0, enfim, àsemelhança física com sua homônima lusitana, fazendo jus à alcunha que lhe aplicaram de "a mais portuguesa das cidades na linha do Equador".

O traçado topográfico acidentado da área urbana a subdivide em dois patamares. Um ao nível do rio, a "cidade baixa", onde funciona o centro comercial. Outro, em um plano mais elevado, a "cidade alta", onde flui com maior intensidade a vida social da comunidade.

Neste, situam-se logradouros e prédios referenciais da urbe como: a Prefeitura Municipal, a Praça de Sant'Ana, a catedral em homenagem à santa do mesmo nome, o Bar Andrade, o imponente quartel do Exército, o antigo estádio de futebol, a Assembleia Recreativa Pauxis, o fórum judicial, o convento dos frades franciscanos, o palácio episcopal, a capela do Bom Jesus etc.

A capela do Bom Jesus há, na origem de sua construção, uma história de fé e de agradecimento a Deus a assinalar. Erguida no topo da colina que marca mais alto da cidade, sua existência se deve ao cumprimento de uma promessa feita pela população.

católica do lugar ao Bom Jesus, por ter livrado a localidade da sanha destruidora dos revoltosos da Cabanagem movimento armado que eclodiu no Pará na primeira metade do século XIX.

Socorro-me dos conhecimentos e da palavra fluida do amigo e conterrâneo Célio Simões de Souza para contar como tudo se passou, reproduzindo um trecho do artigo intitulado “Óbidos sua História sua Gente” que ele escreveu, em 1º de outubro de 2017, publicado no site Obidos.Net.Br, para homenagear nossa terra natal por ocasião das celebrações alusivas ao seu aniversário de 320 anos:

“Ainda como vila enfrentou os percalços da Cabanagem, verdadeira guerra civil que convulsionou a Amazônia de 1831 a 1840, deixando um rastro de milhares de mortos e incalculáveis prejuízos materiais. Após terem tomado Santarém, Monte Alegre e Alenquer, os cabanos investiram sobre Óbidos, sendo firmemente repelidos pelos obidenses, sob a liderança do Padre Raimundo Sanches de Brito e de seu irmão, o também religioso Antônio Manuel Sanches de Brito, que se revelaram excelentes estrategistas.

Os cabanos mudaram de tática. Propuseram desembarcar como "amigos" e assim foram recebidos. A noite, com toda a população dormindo, violaram o acordo e tomaram o Forte, apossando-se das armas disponíveis e promovendo, além de saques, o assassinato de vários cidadãos, especialmente os de origem portuguesa. Eram eles formados por levas de caboclos, desertores do exército, de índios muras e mundurucus e principalmente de escravos ávidos por liberdade. Os que conseguiram escapar daquela noite de terror reuniram-se em torno do Padre Sanches e revidaram ao ataque, conseguindo libertar a vila após renhido combate, colocando os rebeldes em fuga.

Temendo-lhes o retorno, a população predominantemente católica fez solene promessa de erguer um templo caso fosse poupada do assédio dos cabanos. Surgiu assim em 1885 a Capela do Bom Jesus, construída mediante coleta pública no ponto mais alto da colina e hoje ainda lá se encontra como testemunha dessa convulsionada fase da vida política do Império”.

Esse santuário sempre exerceu sobre mim um particular fascínio. Admirava sua concepção arquitetônica incomum, com as escadarias em forma de arco dispostas na entrada frontal, uma de cada lado; o amplo espaço coberto, mas livre de paredes, servindo de antessala ao salão onde aconteciam os ofícios religiosos; as torres do campanário posicionadas lateralmente no meio da edificação; os sons alegres e festivos dos sinos que eu mesmo, quando moleque, comprazia-me vez por outra em badalar.

Atualmente a igrejinha ainda existe, mas descaracterizada em seu formato original. Perdeu as escadarias e as torres, e até mesmo a condição de unidade imobiliária independente, adaptada que foi para incorporar-se à estrutura de um seminário construído na vizinhança da residência do bispo diocesano. Sinto falta de sua presença isolada e altaneira dominando a paisagem.

Terra de grandes nomes da literatura brasileira, dentre os quais os mais insignes são José Veríssimo de Matos e Herculano Marcos Inglês de Souza, ambos membros fundadores da Academia Brasileira de Letras.

Óbidos possui uma tradição cultural rica e diversificada, com destaque para as festas religiosas, o festival do jaraqui e os folguedos populares, como o animado carnaval de rua e as danças folclóricas do mês de junho.

Veja mais em: http://www.obidos.net.br. Acesso em: 20 jun. 2022.

FONTE:
FIGUEIRA, José Pedro Haroldo de Andrade. A Nobreza da Gratidão. Natal – RN: Caravela Selo Cultural, 2022.  Páginas:. 60 – 63.

Comentários  

0 #1 Hugo Jr Ferari 26-12-2022 13:28
Muito interessante saber a [censored]stória da nossa cidade presépio além de ser esquecida e abandonada!
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