Haroldo Figueira.
Estamos em 2018. Curado da ressaca das festas de fim de ano - refiro-me à ressaca do bem, relacionada com o surto de solidariedade, fraternidade e esperança que ciclicamente toma conta das pessoas por ocasião do Natal e da virada do calendário anual – aguardo ansioso o suceder dos dias para saber o que o futuro próximo reserva para nós brasileiros.
Fiéis a uma antiga tradição, as pessoas aproveitam para, nesse período, fazer promessas que podem contemplar, desde simples mudanças de hábitos – algumas já cogitadas anteriormente, mas abandonadas ou postergadas - como cuidar melhor da saúde, recuperar a forma física, deixar de fumar ou de beber, até projetos de vida mais ousados como constituir família, abrir um negócio ou capacitar-se profissionalmente.
A essas aspirações de cunho pessoal, agregam-se outras de ordem social. Todos queremos um Brasil melhor, onde se possa viver dignamente e trabalhar em paz, que seja capaz de proporcionar aos seus cidadãos serviços de qualidade em contrapartida aos impostos pagos. Um país que paute sua administração por princípios éticos e que, enfim, encontre o caminho sem volta do desenvolvimento sustentável.
Nesse sentido, uma janela de oportunidade se abre no presente exercício, haja vista tratar-se de ano eleitoral. Um novo presidente deve ser eleito e, junto com ele, governadores, deputados e parte dos senadores. Cabe aos eleitores, se desejam que as coisas mudem efetivamente, esmerar-se nas escolhas de seus representantes. Trocar João por José, só, não é suficiente. Necessário se faz que José seja uma pessoa moralmente íntegra, portadora de espírito público, comprometida com a melhoria de vida de toda a população.
Cuidado com os salvadores da pátria! Um presidente honesto e bem intencionado não faz promessas enganosas, vazias ou que não tem condições de cumprir. Primeiro, porque não existem soluções simples para problemas complexos. Depois, não basta dizer que vai realizar isto ou aquilo; é preciso mostrar como vai fazer. Por último, não se deve perder de vista que o titular do Poder do Executivo pode muito, mas não pode tudo, ele precisa do apoio do Congresso para governar. Portanto, além de eleger um chefe de governo honrado, mister se faz renovar e depurar o Parlamento também, inclusive desalojando as velhas e predatórias raposas políticas que lá se encastelaram.
Séculos de corrupção endêmica não se erradicam de uma hora para outra. A despeito do bom trabalho realizado pela Lava Jato no combate ao conluio criminoso entre políticos e empresários que, impunemente e há longo tempo locupleta-se com o dinheiro do contribuinte, existe ainda muita faxina por fazer para deixar o poder público asséptico do ponto de vista moral. Favorecimentos e subsídios a grupos que têm condições de andar com as próprias pernas, elevada sonegação, morosidade da justiça, práticas do “toma lá, da cá”, corporativismo, nepotismo, clientelismo, patrimonialismo, fisiologismo, são alguns dos males nacionais que precisam, também, de enfrentamento enérgico e eficaz.
Como a maioria dos brasileiros, torço para que a luta travada em prol da restauração da moralidade pública resulte vitoriosa. Realisticamente, porém, tenho minhas dúvidas quanto ao êxito da empreitada, pelo menos em um horizonte temporal de curto e médio prazo. É que existe, a meu ver, um complicador a mais, de difícil remoção, porque já incorporado aos hábitos culturais de muita gente.
Políticos corruptos, empresários corruptores, servidores públicos venais não surgem por geração espontânea. Eles vêm de uma sociedade que se diz honesta, comprometida com o bem-comum – e há dentro dela muitas pessoas que o são de verdade - mas que tolera e até aprova expedientes de caráter individualista como o “jeitinho brasileiro”, “a malandragem”, “a esperteza”, a lógica do “levar vantagem em tudo” que, no fundo, nada mais são do que formas antiéticas e desagregadoras de favorecer-se prioritariamente de benefícios sociais, em desrespeito aos direitos e preferências alheias.
Ora, no âmbito de um Estado democrático e republicano, os interesses particulares não podem sobrepor-se aos interesses coletivos. Quando a inversão acontece, dá azo, inclusive, para que gente inescrupulosa, avessa aos valores da cidadania, avance sobre os cofres do erário desviando, em proveito próprio, recursos que vão fazer falta à saúde, à educação, à segurança, à geração de empregos e a tantas outras atividades essenciais, prejudicando o restante da população, principalmente as camadas mais carentes. A esse filme, reprisado tantas vezes, gostaria de não mais ter de assistir.