Membros do Ministério Público e de organizações de alunos, professores e demais servidores da educação no Pará voltaram a defender que o retorno das aulas presenciais só pode ocorrer se autoridades da área de saúde garantirem que a medida não trará risco à vida dos integrantes da comunidade escolar, de seus familiares e da população em geral nesta pandemia da covid-19.
A reiteração desse posicionamento do Ministério Público Federal (MPF), Ministério Público do Estado do Pará (MPPA), Ministério Público do Trabalho (MPT) e de entidades representativas dos vários ramos da comunidade escolar paraense foi feita nesta terça-feira (11), em videoconferência com a secretária estadual de Educação, Elieth de Fátima Braga, e com o procurador-geral do Estado, Ricardo Nasser Sefer.
Eventual aprovação do retorno às atividades presenciais deve estar baseada na existência dos seguintes pré-requisitos: estudos científicos amplamente divulgados, isonomia de critérios de liberação das redes de ensino, participação social nos processos decisórios e na elaboração do plano de retomada, e garantia de qualidade das aulas, frisaram os membros dos MPs e os representantes da comunidade escolar.
Não discriminação
A necessidade da isonomia de critérios para o tratamento das demandas da rede pública e da rede particular de ensino, assim como para a educação da cidade e do campo – incluindo a educação indígena e quilombola –, foi um ponto bastante destacado pelo MP e por educadores, como forma de não permitir a ampliação das diferenças de qualidade de ensino entre esses segmentos.
Se foi detectada a existência de segurança ou de insegurança sanitária em uma determinada região, decisões tomadas com base nessa constatação têm que ser aplicáveis a toda a comunidade escolar, e eventuais exceções a essa regra devem ser justificadas em detalhes, defendem os membros do MP e organizações representativas de alunos, educadores e servidores da educação.
Adequação à realidade local – Ministério Público e comunidade escolar também concordam que qualquer plano de retorno às atividades tem que levar em consideração que o chamado modelo híbrido de aulas – em que parte do ensino é online – é inadequado para a realidade do Pará, onde a internet e os dispositivos tecnológicos ainda são inacessíveis para boa parte dos estudantes. Para que esse modelo possa ser adotado no Estado é preciso que antes ocorra a democratização do ensino remoto, argumentam representantes dos alunos.
Outras diretrizes que nem sempre são diretamente aplicáveis à realidade paraense e de outros estados são as emitidas pelo Conselho Nacional de Educação (CNE), destacam alunos, professores, demais servidores da educação, e membros do MP. Muitas vezes, essas diretrizes têm sido totalmente discordantes com o dia a dia de precariedade na educação nos Estados e municípios – principalmente no campo –, e algumas vezes negacionistas dessa realidade e até mesmo da pandemia, apontaram participantes da reunião. Por tudo isso, as diretrizes do CNE não só são passíveis de críticas como podem ser impugnadas, registra o MP.
Diálogo como base
As críticas, sugestões e reivindicações da sociedade relativas à volta às aulas presenciais vêm sendo coletadas pelos MPs desde o segundo trimestre deste ano, por meio de reuniões ampliadas que contaram com cerca de 350 participantes, e de escuta pública, que teve a participação de 21,6 mil pessoas, entre alunos, pais e responsáveis, professores, técnicos e gestores de instituições de ensino (detalhes sobre os resultados da escuta: https://bit.ly/30MYgAF ; gráficos dos resultados: https://bit.ly/31L9bKq).
Todo esse trabalho conjunto entre o Ministério Público e a sociedade também resultou na expedição de recomendações ao governo do Estado e à prefeitura de Belém contra o retorno das aulas presenciais sem segurança epidemiológica.
Na reunião desta terça-feira (11), em que foi apresentado aos representantes do governo estadual um resumo consolidado das conclusões desse processo de diálogo e colaboração, os representantes dos MPs também requisitaram ao procurador-geral do Estado uma reunião com os representantes do Comitê Técnico da área de saúde responsável pelas análises e decisões relativas à volta das atividades escolares presenciais.
Respostas e demais informações – A titular da Secretaria de Estado de Educação (Seduc) disse aos participantes da videoconferência que a Secretaria vem adotando diversas medidas para garantir um retorno seguro às atividades presenciais, e que a prioridade é que as escolas não sejam locais de risco e transmissão para alunos, pais e servidores públicos. Os servidores da área da educação solicitaram à secretária acesso aos detalhes sobre as medidas adotadas.
Em relação à decisão sobre a possibilidade ou não do retorno das aulas presenciais neste momento, Elieth de Fátima Braga disse que o governo estadual deve se manifestar após a análise de pesquisa epidemiológica. “Se as autoridades da saúde não aprovarem, não haverá retorno”, garantiu.
Segundo ela, por enquanto só foi decidido o retorno dos alunos do último ano do ensino médio para que eles tenham condições de competir no Exame Nacional da categoria (Enem). A secretária lembrou que o Estado também tem oferecido aulas e conteúdos educacionais pela TV Cultura e na internet.
O procurador geral do Estado se comprometeu a providenciar o agendamento da reunião com o Comitê Técnico de Saúde, e garantiu que todas as decisões sobre a volta das atividades presenciais serão tomadas da forma mais isonômica possível. Seffer frisou que o governo estadual sempre esteve à disposição para ouvir críticas e sugestões da sociedade, de forma a enriquecer o processo decisório, e que todas as decisões estão sendo adotadas de modo cientificamente adequado, com a ponderação necessária.
Representante do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) informou na reunião que a organização está à disposição do Estado, dos municípios e de toda a sociedade para auxiliar na construção dos planos de retomada.
Representantes dos professores ressaltaram que, apesar de ter recebido recomendação dos MPs para evitar o retorno irresponsável às atividades escolares presenciais, a prefeitura de Belém está obrigando os professores a retomar o trabalho presencial, e por causa desse retorno alguns profissionais já se contaminaram pelo novo coronavírus. Segundo os professores, a mesma situação se repete em Jacareacanga, no sudoeste do Estado.
Assessoria de Comunicação do MPF