Sambaquis são sítios arqueológicos formados por terra e conchas que guardam importantes informações do passado.
O projeto “Janelas Abertas para a Biodiversidade do Baixo Amazonas (JABBA)”, formado por um grupo de cientistas da Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa), cuja maioria é de mulheres, voltou a escavar sambaquis amazônicos, depois de um período de quatro décadas. E os pesquisadores não estarão sozinhos. A equipe está estimulando a participação de comunidades ribeirinhas que vivem ao longo da área de alcance do projeto.
A primeira expedição do grupo de pesquisa foi realizada, durante 15 dias, no início do mês de novembro deste ano, quando a equipe iniciou as escavações no sambaqui da Ponta do Jauari, localizado na várzea, entre os municípios de Curuá e Alenquer, no estado do Pará.
O projeto tem duração de três anos e, nesse tempo, estão previstas escavações em um perímetro de 500 quilômetros de várzeas no Baixo Amazonas, que vão desde o município de Terra Santa até Porto de Moz. É nesta área que está a Reserva Extrativista Verde Para Sempre, localizada às margens do rio Amazonas. “Além de mapear e documentar os sambaquis existentes nesses 500 km do rio Amazonas, a proposta do JABBA é investigar como os sambaquis do passado contribuem para a conservação ambiental no presente amazônico”, explicou a coordenadora do projeto, Gabriela Prestes Carneiro.
“O grande volume de vestígios de moluscos, peixes e quelônios, que compõem a estrutura do sambaqui, chama a atenção, bem como ossos de peixe-boi, indicando a abundante presença dessa espécie, na região, durante a época em que o sítio foi habitado e construído”, afirma Gabriela Carneiro. A arqueóloga esclarece que nesse mesmo local também foram encontradas em superfície diversas lâminas de machado (ferramentas feitas de rocha polida) e cachimbos de cerâmica decorados que são “semelhantes a exemplares coletados anteriormente na superfície do sambaqui pelo Frei Protásio Frikel na década de 1940”.
Evidências - “Essas evidências podem nos ajudar a estudar a história dos povos sambaquieiros que habitavam a várzea amazônica, suas técnicas e manejo dos recursos aquáticos, a fim de observar como o ecossistema desses ambientes pode ser monitorado, conservado e utilizado hoje em dia, assim como nossos antepassados fizeram durante muitos anos. A conservação ambiental e a consciência da importância da várzea para o futuro das pessoas e do planeta são um dever de todos. Por isso, é estimulado um trabalho coletivo e integrador com as comunidades ribeirinhas do Oeste do Pará, que convivem com esses sítios arqueológicos e, consequentemente, com a paisagem e seus recursos”, esclareceu Gabriela Carneiro.
Interdisciplinaridade - Também é objetivo do projeto promover um diálogo maior entre os cursos de graduação e laboratórios da Ufopa. Por esse motivo, uma parceria está sendo construída com o curso de Licenciatura em Biologia, do Instituto de Ciências da Educação (Iced), e nessa primeira etapa de campo estavam presentes alunos da disciplina de Herpetologia, ministrada pelo professor Alfredo Santos Júnior. Os alunos e bolsistas da graduação e pós-graduação estão aproveitando as etapas de campo de escavação para a criação de coleções biológicas de referência de espécimes modernos e também coleções osteológicas (de esqueletos) de animais como anfíbios e répteis.
Para os pesquisadores, essas coleções são importantes pois elas permitem conhecer a biodiversidade através do registro material e as especificidades de répteis e anfíbios presentes em ambientes de várzea. A partir dos materiais depositados nas coleções é possível extrair diversas informações, dentre elas aspectos sobre a anatomia, ecologia, história natural, de como vivem e quais adaptações esses animais precisam para sobreviver nos ambientes de várzea, como é o caso da pesquisa que está sendo elaborada pela doutoranda Ana Maria de Sousa Coelho, do Programa de Pós-Graduação BioNorte (PPG-BioNorte/Ufopa), que estuda uma espécie de serpente amazônica. Além disso, os esqueletos modernos também são ferramentas para identificar as espécies de animais que antes estavam sendo usadas nos sambaquis.
O que são sambaquis - Os sambaquis são sítios arqueológicos formados por camadas de terra e conchas, coletadas por sociedades humanas para muitas finalidades, que guardam informações sobre o passado e são preservados devido ao carbonato de cálcio presentes na composição dessas conchas.
“A última escavação realizada em um sambaqui fluvial, na região do Baixo Amazonas, foi feita por uma equipe coordenada pela arqueóloga estadunidense Anna Roosevelt, na década de 1980, na fazenda Taperinha, próxima à cidade de Santarém”, lembra a arqueóloga Gabriela Carneiro.
“De lá para cá, apesar de conhecidos por moradores da região de várzea e pela comunidade acadêmica a partir de artigos científicos, os sambaquis do Baixo Amazonas não tinham sido escavados e estudados a fundo”, explicou a professora do Instituto de Ciências da Sociedade (ICS).
Financiamento - O projeto conta com apoio financeiro do Instituto Serrapilheira, instituição privada de fomento à pesquisa no Brasil. “Vale ressaltar que o projeto de pesquisa foi o único da região Norte no ano de 2021 a ter sido selecionado para receber o financiamento e terá duração de três anos”, comemora Gabriela Carneiro.
Equipe do projeto – Gabriela Prestes Carneiro (Ufopa/ICS), Anne Py-Daniel (Ufopa/ICS), Myrtle Shock (Ufopa/ICS), Myrian Sá Leitão-Barboza (Ufopa/ICS), Claide Moraes (Ufopa/ICS), Carlas Ramos (Ufopa/ICS) e Alfredo Santos Júnior (Ufopa/Iced).
Fonte: Comunicação/UFOPA