BELA INFÂNCIA

BELA INFÂNCIA

Izarina T. Israel. 

Hoje, ao ler um texto publicado na AALO, sobre como foi a infância dos que hoje estão nos sessenta anos para a frente, peguei-me com a garganta já saturada por medicamentos da COVID/ÔMICRON e os olhos embotados, ao fazer uma verdadeira viagem ao túnel do tempo e não contive as lágrimas.

Que texto fantástico!

Parece mentira que, vivi tudo aquilo por ser uma menina que, adorava não só bonecas, mas, principalmente, brinquedos e jogos de moleques.

E como foi tão bom!

Tinha meu irmão Isaac, o judeu, Isamar, gêmea deste, o primo Rosinei, com apenas 8 anos, que veio morar conosco após uma doença de sua mãe, considerada grave naqueles tempos e eu com doze anos. Só os abandonei nas brincadeiras de rua, com a chegada da Menarca.

Foi quando comecei a arranhar meus primeiros poemas.

Crescemos juntos.

Nós àquela época, embora não passássemos dificuldade, não tínhamos mais aquela vida farta e fácil que, existiu até meu pai falecer. Por essa época eu tinha apenas nove anos e ganhamos o primo que aprendemos a amar como irmão.

Minha querida mãe Deusa acordava às três da madrugada para molhar suas plantas e encher os tambores, pois, era escasso o fornecimento de água. Em seguida, invariavelmente, enfiava nos cabelos cor de prata, um punhado de perfumados e adocicados jasmins e após ia preparar nosso café da manhã. Enquanto isso,  Rosinei ia à padaria de seu Antônio, comprar os excelentes pães que ele produzia e aos quais dava preferência.

Quem tivesse aula pela manhã, seguia e os que ficavam iam brincar.

Como eu estudava no horário intermediário, tinha a manhã e à tarde com tempo livre.

Era o momento de minha mãe preparar as massas para os pastéis, canudinhos e até rosas do Adro, também conhecida como rosa de maio e bolos o que fazia com todo cuidado e carinho.

Aos sábados e domingos ela trabalhava bem mais suas iguarias, os quais entregava no Bar Andrade e no Ponto Chique, do senhor Plácido, localizado na Praça de Sant'Ana e em outros bares menores.

Durante a semana, fazia serviços voluntários no Asilo  e no Albergue dos Tuberculosos, mantido pela Prelazia.

Enquanto ela se desdobrava no trabalho para dar uma vida melhor aos pequenos, nos liberava para as brincadeiras e quando ouvíamos sua voz nos chamando, já chegávamos junto a ela para ver o que precisava. Era sempre um material que faltava. E logo nos liberava para os folguedos.

Voltávamos às brincadeiras que podiam ser em nossos enormes quintais ou na rua.

Eu era uma fera no bole-bole feito de pedrinhas ou caroços de mucajá ou tucumãs pequenos, bem lixados e brilhosos. De pega-pega, passar bandeira, trinta e um alerta, bambolê que fazíamos com grossos cipós que trazíamos de nossa colônia no Patauazal. Macaca, cemitério, passa anel, raminho destroncado, pira pega, pata cega, rodas e de jogar ferros apontados para enterrar no chão e ir riscado e que vez por outra, acertavam nossos pés, dos quais não recordo o nome. Brincávamos de carrinhos de rolimã feitos pelo Rosinei, com latas de leite ninho vazias e fazíamos nossos próprios papagaios com papéis se seda colorida e quando nosso cerol cortava o papagaio do amiguinho gritávamos: 

-  Chinou, chinou. Além disso, tínhamos nossos piões que jogávamos e aparávamos na unha do polegar.

É, eu fui quase um perfeito moleque!  E como fui e sou muito feliz!

Minha mãe tinha gênio forte, era uma Sagitariana como eu. E nos criou com pulso de ferro.

Tinha um grande defeito, não saber cobrar pelos seus prestimosos, os quitutes para grandes aniversários, como foi os quinze anos de uma filha do Sr. Isaac Hamoy e por não dar o devido valor ao seu trabalho ou por vergonha de cobrar, o deixava por conta de quem o encomendasse. E às vezes, isso não dá certo.

Houve uma época que, veio de Roma um Núncio Apostólico visitar Óbidos e a estes trabalhava de graça, uma vez que fazia já serviços voluntários no Asilo para Idosos e à noite nos fazia costurar cueiros, fraldas e camisinhas para os recém nascidos e distribuídos ao Clube de Mães. Fazia-nos  amarrar cipós de piaçava para as vassouras confeccionadas na oficina da Escola São Francisco e tarefa esta que era destinada  aos velhinhos. Não aceitávamos de bom grado, mas, obedecíamos e ao que hoje agradeço. Me fez ver o valor de ajudar ao próximo. Ajudava ainda a entregar os remédios no Albergue de Tuberculosos que era mantido pela Prelazia.

Quando da festa para o Núncio Apostólico de Roma que, chegaria dia cinco de Novembro pela manhã e haveria um coquetel de boas-vindas, este ela não pode fazer, pois, faleceu na noite anterior ao dia seis, vítima de um Edema Agudo do Pulmão, por se  exceder no trabalho.

Sou grata a Jesus ter permitido que eu pudesse viver em uma época de ingenuidade e esperanças no futuro.

Enquanto o autor sorria ao editar seu texto, eu diante de tantas recordações, não pude conter as lágrimas.

Ainda hoje, lembro saudosa com carinho desta fase maravilhosa que é a infância e a adolescência e de todas as minhas professoras e de um professor de Inglês e Desenho que, juntamente com minha família biológica próxima e parentes, me ensinaram a ser correta, honesta, otimista, fraterna e resiliente, me mostrando que o amor e a educação é para dar e ser recebida em primeiro lugar no seio da família.

Se dermos amor, é certo que o receberemos e seremos pessoas boas, que aprenderam o valor do respeito, ética, e gratas a família, aos outros e a todos os seres vivos e ao Planeta.

Só assim cresceremos como pessoa!

25.01.2022

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