Retorno às Raízes na Comunidade Quilombola do Mondongo

Retorno às Raízes na Comunidade Quilombola do Mondongo

Por João Canto.

A manhã começava com uma leve brisa carregada pelo rio Amazonas, enquanto um grupo de amigos se reunia na entrada do Laguinho Pauxis, em Óbidos, prontos para embarcar na bajara do Sr. Joaquim Marialva. Era dia 24 de julho de 2024, e a expectativa estava no ar. Evander Batista, um filho orgulhoso da Comunidade Quilombola do Mondongo de Baixo, havia organizado um passeio de volta às suas raízes, convidando amigos para compartilhar desse reencontro com sua comunidade.

O grupo, composto pelos obidenses – Sr. Joaquim Marialva Baima, comandante da Bajara e seu filho Rivas, Aline e João Canto, Janari, Ilda Azevedo, Marcos Marinho e Edna Baima, Romualdo Andrade e Lucilene, Ana Paula Azevedo, Rubens e seu filho Erivan, Carlinho Pinheiro e, claro, o próprio Evander – partiu rumo ao desconhecido para muitos, mas familiar e repleto de memórias para alguns deles.

Viajantes, saindo de Óbidos

O rio Amazonas, imponente e sereno, foi o primeiro a nos guiar, por suas águas barrentas e o céu azul. A travessia pelo estreito Igarapé da Capela foi uma verdadeira demonstração de habilidade por parte do Sr. Joaquim Marialva, que, com maestria, conduziu a bajara pelos obstáculos naturais. Galhos submersos, árvores caídas e ribanceiras não foram páreo para a experiência de anos de navegação pelas águas da região.

Ao sair do igarapé, fomos recebidos pelo vasto Lago do Mondongo, cuja superfície agitada foi vencida pela Bajara do Sr. Joaquim Marialva. Atravessá-lo foi uma experiência de contemplação; a pressa, que poderia ser comum em outros contextos, não tinha lugar ali. A natureza ao redor era uma obra de arte viva, que merecia ser apreciada em cada detalhe. Os olhos de todos estavam vidrados na paisagem, absorvendo a imensidão da região de várzea, o som distante de pássaros e das águas agitadas por conta do vento.

Chegando no Mondongo de Baixo

Ao chegar à comunidade, um novo desafio se apresentava: o lamaçal característico do período de vazante do rio. Com os pés afundando na lama, seguimos adiante, impulsionados pelo desejo de explorar cada canto daquele lugar carregado de história e tradição.

Viajantes vencendo o lamaçal deixado pela vanzante.

A Casa do Sr. Marialva, tio de Evander, foi o primeiro ponto de parada. Lá, uma ponte recém-construída nos levou até o centro da comunidade, onde visitamos a escola local e o Centro Comunitário, a Igreja de Santo Antônio, padroeiro da Comunidade, lugares que simbolizam a resistência e a união dos moradores. A história viva da comunidade estava presente em cada conversa com os moradores do lugar.

Visita ao Centro Comunitário do Mondongo

Foi na casa de Francisco Oliveira, carinhosamente chamado de Chico Sapo, que encontramos um dos momentos especiais da viagem. Ele nos recebeu com um drink de “mangarataia ou gengibre” e cachaça, enquanto nos contava histórias da comunidade, algumas reais, outras fruto de sua rica imaginação e dos antigos moradores. Seu Chico também nos mostrou os achados arqueológicos que havia coletado nas redondezas, relíquias de tempos passados, que contavam silenciosamente a história de seu povo.

Na casa do Sr Chico

Quando o cheiro do almoço começou a se espalhar, todos sabiam que estavam prestes a experimentar algo único. O cardápio, preparado pelas mãos habilidosas das Sras. Francisca e Shirley, trouxe à mesa iguarias como o Acari Assado e uma Caldeirada de Tamuatá. Os peixes, enormes e suculentos, eram impossíveis de encontrar, daquele tamanho, em qualquer mercado de Óbidos. Eram exclusivos do Mondongo, como se a natureza reservasse seus melhores frutos para aqueles que conheciam o caminho até ali.

Olhem o tamanho do Acari do Mondongo! Na foto, Shirley!

A tarde foi se despedindo lentamente, enquanto a bajara voltava pelo mesmo caminho, agora com um silêncio reflexivo entre os passageiros. A beleza incomensurável do Mondongo e a riqueza cultural de sua comunidade deixaram todos tocados de uma forma profunda. Para Evander, aquela viagem não era apenas uma visita, mas um reencontro com suas origens, um fortalecimento de sua identidade.

As árvores floridas fazem parte do cenário do Mondongo.

Ao voltarmos para Óbidos, a certeza de que o Mondongo é mais que uma comunidade isolada, mas um símbolo de resistência e cultura viva, estava impressa em todos nós. Aquelas raízes que Evander nunca esqueceu, e que sempre o trazem de volta, são as mesmas que sustentam uma história rica, que merece ser contada e preservada. E nós, por um dia, fizemos parte dessa história, guardando no coração um pedaço do Mondongo.

A seguir uma Galeria das Fotos que fizemos durante a visita ao Mondongo de Baixo:

Fotos....

Fotos de João Canto

 

Comentários  

0 #1 Hugo Ferrai Jr. 13-08-2024 18:13
Concordo no final do trecho que diz que a [censored]stória merece ser preservada, que é isolado!
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